quarta-feira, 27 de julho de 2011

"Línguas estranhas e o Livro de Atos dos Apóstolos"

Apesar de agora estar nas prateleiras mais baixas do expositor das habilidades evangélicas, o dom de línguas por muito tempo representou o ápice de “poder e comunhão” com Deus. 

A cada urro vindo do púlpito - ou de qualquer lugar - despertava um intenso frenesi na multidão, que ávida por demonstração de poder, espraiavam suas “línguas estranhas” trazendo a euforia necessária – carnal - para reverberação dos “linguálatras” em meio a assembleia.


A reverência e a proclamação da palavra submetiam-se a balbúrdia circense em que era tomado o “culto a Deus”. Cada um fazia conforme seu próprio espírito concedia: gritos, gargalhadas, abraços, choros, dispunham da euforia em nome de Deus.  

Nas mentes  - e nos corpos suados - exalavam a soberba que, sem meias palavras, vociferavam o diagnóstico de morte a tudo que respirava ordem e decência.

Hoje, (espero, mas não sei) apenas um remanescente sobrevive ostentando a manutenção de tais poderes, a grande maioria daqueles “homens de deus” partiu para outro nicho espiritual ou mesmo volveu-se ao próprio vômito. 

São modismos evangélicos que fazem plantão em busca de "avivamento". Quem não lembra dos dentes de ouro? Da bênção de Toronto, com suas gargalhadas e quedas santas? A bolsa de valores M&M (Malafaia e Murdock) atribuindo o valor da alma humana? Fogueira santa? e muitos outros.

Percebe-se que o espírito de Balaão - a necessidade de projeção pessoal, o enriquecimento fácil e o desconhecimento do caráter de Deus - está presente em nosso meio, e ele contribui significativamente para essas e muitas outras “esquisitices evangélicas”.

Sim, mas e o dom de línguas  como experimentam e ensinam os pentecostais procede das Escrituras? 
Mister é questionar: As Escrituras oferecem suporte a tal prática? O que elas dizem sobre tal 

2. Precisamos de discernimento -manifestação? Vejamos o dom de línguas nas páginas do livro de Atos dos Apóstolos.



O Livro de Atos inicia com uma sequência frenética de eventos: Há o mandamento do Senhor; a promessa de um novo batismo pela vinda do Espírito Santo; sua subida aos céus; a eleição do substituto do Apóstolo Judas; e por fim a vinda do Espírito conforme a promessa. Não sabemos em quanto tempo se deram esses fatos, mas é inegável o turbilhão da narrativa.

São desdobramentos que neste Livro se iniciam, outros são apenas sequências retomadas, portanto, iniciadas em pontos anteriores do texto sagrado.

Temos que nos curvar frente algumas necessidades:
1. Precisamos empreender cuidadosa leitura, como em um novelo de linha emaranhado, puxando linha após linha, encontrando sua sequência correta, até podermos vê-lo como novelo, um único fio. Assim, chegaremos a um veredicto que harmonizará os temas retomados ou iniciados aqui. Chegando a única verdade, e essa reflita o caráter e o propósito de Deus. grandeza de alma e humildade de coração - pois muitos são os enganos e falácias destes dias maus, e nossos corações tendem a cooperar com o presente século mal.

3. Precisamos de coração renovado e que o Ajudador prevaleça e as Escrituras forjem nossas mentes.

“Porque, embora andando na carne, não militamos segundo a carne, pois as armas da nossa milícia não são carnais, mas poderosas em Deus, para demolição de fortalezas; derribando raciocínios e todo baluarte que se ergue contra o conhecimento de Deus, e levando cativo todo pensamento à obediência a Cristo”; (2 Co 10:3-5)

E podemos afirmar que afinal temos a mente de Cristo (1 Co 2.16)

Comecemos pelo v. 4 onde fala a respeito da PROMESSA DO PAI dita aos Apóstolos. Que promessa é referida pelo Senhor? Obtemos a resposta no v.5:

“Porque, na verdade, João batizou em água, mas vós sereis batizados no Espírito Santo, dentro de poucos dias.”

A promessa compreendia um “batismo diferente do batismo de João”, pois diz: "sereis batizados no Espírito Santo".


Há, portanto, a correspondência entre a promessa a ser cumprida - o batismo no Espírito - e o batismo que João vinha realizando em Israel.

Essa correspondência está presente em todos os Evangelhos. João, o batista, garante-nos que seu batismo com água seria substituído pelo batismo com Espírito e com fogo (Mt 3.11; Mc 1.8; Lc 3.16; Jo 1.33).

“Eu, na verdade, vos batizo em água, mas vem aquele que é mais poderoso do que eu, de quem não sou digno de desatar a correia das alparcas; ele vos batizará com o Espírito Santo e com fogo”. (Lc 3.16).

Mas já àquela ocasião o cerimonial de João se mostrava transitório. João antecipa-se afirmando sua saída do cenário que se iniciava. 

"É necessário que ele cresça e que eu diminua". (Jo 3:30)

Logo João é preso (Jo 3.18-20 e Mt 4.12) encerrando seu  ministério. Essa transitoriedade logo se fez notar. 


Foi por curto espaço de tempo que João e Jesus caminharam juntos. O desconhecimento por parte de João sobre o que se cumpria em Jesus reflete esse tempo. Talvez, por isso sua dúvida a respeito se Jesus seria mesmo o Cristo (Mateus 11).

Cumprido o ministério de João, o que ocorreu com o seu batismo? 


Em João 4.1-2, lemos que:

“Jesus, fazia e batizava mais discípulos do que João (ainda que Jesus mesmo não batizava, mas os seus discípulos)”.

Não temos motivos para acreditar que o batismo dos discípulos do Senhor diferisse da forma ou propósito do batismo de João. Os discípulos de Jesus passaram a batizar o “batismo de João”, familiarizados ficaram com o ritual.

É necessário resgatar o propósito do batismo iniciado por João: para que o Messias fosse manifestado a Israel (Jo 1.31).

O batismo de João está inserido na moldura do anúncio do Messias, portanto o batismo de João faz parte da revelação do Senhor Emanuel - Deus conosco - para Israel.

Que importância há no fato do batismo de João servir para anunciar Jesus para Israel? Toda, pois esse propósito foi estendido para o batismo anunciado pelo Senhor. 

Leiamos pois.

Ao anunciar-lhes o batismo no Espírito Santo diz:
“mas vós sereis batizados no Espírito Santo, dentro de poucos dias” (1.5)

E depois, ainda sobre o batismo diz (1.8):
“Mas recebereis poder, ao descer sobre vós o Espírito Santo, e ser-me-is testemunhas, tanto em Jerusalém, como em toda a Judeia e Samaria,e até os confins da terra”.

O batismo no Espírito Santo capacitaria aos discípulos para testemunhar de Cristo em Jerusalém, na Judeia, Samaria e até os confins da terra.

Apenas pela completa falta de temor e honestidade é possível esquivar-se que o batismo no Espírito Santo é infusão de poder nos discípulos para testemunhar de Cristo por toda a terra.


Há, portanto, uma correlação de propósitos entre os dois batismos: anunciar a Jesus, e agora por toda a terra. Esse ponto é a identificação e harmonia do novelo de linha.

Não me aventuro a afirmar que naquele momento tais características estivessem perfeitamente claras para os discípulos do Senhor, mas prossigamos em conhecer o Senhor. 
No Livro de Atos dos Apóstolos, cap. 2.4, está escrito sobre a chegada do Espírito Santo:
“todos ficaram cheios do Espírito Santo e passaram a falar em outras línguas segundo concessão do Espírito Santo”;

Não há dúvidas: a vinda do Espírito Santo proporcionou aos discípulos "falar em outras línguas". Temos aqui um questionamento oportuno: Qual a natureza da língua falada - seria humana, seria angelical? No v. 11 há  o testemunho:

“como os ouvimos falar em nossas próprias línguas?”

Nos vv. 8-11 lemos os termos: “língua que nascemos”; “próprias línguas”. Há a citação de pelo menos 12 etnias ou povos neste contexto

A despeito do detalhe exegético que envolve o termo “línguas”, o registro é de   idiomas humanos


Sobejam razões – textuais e lógicas - para afirmarmos que naquele evento - dia de Pentecostes - cumpriu-se a promessa do Pai (1.5; 2.4; 3.33-34): o batismo no Espírito Santo. Como resultado deste batismo, os discípulos de Cristo passaram a falar em diversos idiomas humanos.

A corroborar com essa tese temos o cenário da época e a missão que estava sobre os ombros dos discípulos – anunciar a Cristo por toda a terra. 


Considerando que os apóstolos eram todos judeus e que havia inúmeras nações debaixo do sol onde Cristo seria proclamado, é razoável e adequado que o Espírito Santo tenha capacitado aqueles homens a falar abruptamente em idiomas estrangeiros - das nações citadas textualmente. 


As “línguas estranhas” no Livro de Atos dos Apóstolos nada mais são  que idiomas humanos. O contexto, o texto, a lógica não permitem qualquer alusão a “línguas angelicais ou extáticas”.

Apenas o espírito de Balaão é capaz de prover a energia necessária para trocar a honra de Deus pela usura, carnalidade e impiedade que sustentam os dons “pentecostais”.